Será a infraestrutura de carregamento de carros elétricos suficiente em Portugal?

A marcha da inevitabilidade – sem nenhum sentido depreciativo – ainda está em fase de aceleração, longe de se poder afirmar desde que a eletrificação do automóvel atingiu a velocidade de cruzeiro e subsistem dúvidas sobre a viabilidade e o sucesso desta que é a mais abrupta, profunda e certamente rápida evolução no paradigma da mobilidade.
Com a produção e comercialização de veículos elétricos em crescendo exponencial, uma questão primordial impõe-se: em Portugal, haverá oferta de pontos de carregamento suficientes para responder às necessidades do veloz aumento da procura?
A Mobi.e, empresa responsável pela gestão e monitorização da rede de mobilidade de carros elétricos, garante que sim, e prevê que no país, até 2025, sejam criados mais de nove mil pontos de carregamento e mais de 76 mil até 2050, totalizando, nessa altura, mais de 80 mil pontos.
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A credibilizar essa estimativa, a Mobi.e apresentou-a há dias o estudo Infraestruturas de Carregamento de Apoio à Transição Energética da Mobilidade em Portugal, em que conclui que, até 2050, serão instalados no total mais 7.750 pontos rápidos e mais 10.200 ultrarrápidos. Atualmente, a percentagem média de postos de carregamento rápidos e ultrarrápidos em Portugal encontra-se nos 37%, valor acima da média europeia (20%).
Em relação aos pontos de carregamento para veículos pesados, o estudo prevê que sejam instalados mais 1.588 até 2050.
Outro dado relevante no estudo é a potência da rede, que atualmente é de 216 MW (acima do valor necessário de 195 MW), mas com uma previsão de alcançar os 1.230 MW até 2030 e os 3.320 MW até 2050.
Um carregador por cada 10 fogos em cidade
O estudo refere também que, para veículos com 300 km de autonomia, apenas são necessários cerca de dois carregamentos por mês (considerando uma distância média percorrida de 20 km por dia) ou seis vezes por mês em zonas suburbanas ou rurais (onde a distância média diária percorrida é de 60 km).
Ou seja, a Mobi.e considera que “não é necessário um ponto de carregamento por alojamento, mas sim um carregador por cada 10 fogos, em zona de cidade, ou dois carregadores por cada 10 fogos, em zonas suburbanas e rurais”. De acordo com dados da ACEA integrados no estudo, é também de considerar que a percentagem de carregamentos efetuados em postos públicos é de 67% nas cidades, 52% nas zonas suburbanas e de 57% em zonas rurais.
Este ano, até 30 de setembro, a Mobi.E registou mais de 3 milhões de carregamentos, ou seja, mais 64% face ao ano passado (2,4 milhões). Integram atualmente a rede Mobi.e 5.167 postos e 8.367 pontos de carregamento, com 26 postos a serem instalados, em média, por semana. Já ao nível dos consumos de energia, foram consumidos em Portugal, este ano, até 30 de setembro, 48.266 MW, um aumento de 89% em comparação com o mesmo período de 2022.
No que diz respeito ao valor de investimento, está prevista até 2050 uma aplicação de capital que ronda os 1,7 mil milhões de euros, de forma a cumprir o regulamento europeu Alternative Fuel Infrastructure Regulation (AFIR). Este investimento vai permitir uma poupança adicional de 3,3 milhões de toneladas de CO2, com um benefício económico estimado de 1,9 mil milhões de euros.
“Enquanto instrumento público para o desenvolvimento da mobilidade sustentável, é nossa responsabilidade proporcionar o crescimento mais acelerado de uma rede abrangente em todo o país, de maneira a facilitar cada vez mais a transição energética, mas também contribuir com informação e conhecimento que permita tomar as decisões mais acertadas neste processo”, explica Luís Barroso, presidente da Mobi.e.
Vendas de elétricos novos duplicam em 2023
O crescimento dos postos de carregamento acompanha a evolução da procura por carros elétricos. De acordo com os dados da Associação Automóvel de Portugal (ACAP), até setembro de 2023 verificou-se um aumento de 108 por cento nas vendas de veículos ligeiros de passageiros novos elétricos em comparação com o mesmo período do ano anterior, tendo sido matriculados 25.655 unidades.
Nos veículos ligeiros de mercadorias elétricos, o crescimento foi ainda mais significativo. Nos primeiros nove meses do ano foram comercializados mais 246,7 por cento dessas viaturas do que no mesmo período do ano anterior.
E a rede elétrica suportará este boom? A Mobi.E assegura que a E-redes, entidade responsável pelo fornecimento de energia à rede de postos de carregamento, confirma que “está preparada” para dar resposta aos atuais níveis de consumo, “uma vez que ela própria se vai adaptando e crescendo em função das necessidades do país”.
De momento, a utilização da rede pública de carregamento “raramente” ultrapassa os 25% da totalidade existente, “pelo que está preparada para absorver o crescimento expectável de veículos 100% elétricos e plug-in”, frisa a gestora, informando que até ao início de maio de 2023, a potência dos postos de carregamento era equivalente a 188.643 kilowatts (kW).
“Ou seja, Portugal tem uma potência disponível cerca de 68% acima da meta que terá de cumprir aquando da aprovação do novo Regulamento europeu Alternative Fuel Infrastructure Regulation (AFIR)”, esclarece a E-redes.
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Quanto ao tipo de carregadores, a maioria são semirrápidos (1.915) e normais (273), representando 63% do total dos postos que integram a rede, ao passo que os carregadores rápidos pesam 33% do total. É nos municípios do litoral que estão concentrados o maior número de tomadas, segundo os dados da Mobi.E.
Entre os comercializadores, a Galp é quem lidera, com o maior número de postos de carregamento para veículos elétricos. Segundo a Mobi.E, a petrolífera detém 813 postos de carregamento, enquanto a EDP Comercial acumula 592, a KLC acompanha com 574 postos e a PowerDot regista 454 carregadores.
140 milhões de postos até 2040
Num estudo da EY, a consultora estima que, até 2040, o número de postos de carregamento necessários para dar resposta aos cerca de 239 milhões de automóveis elétricos, que estarão em circulação na Europa, ultrapassará os 140 milhões.
Atualmente existem mais de 482.000 pontos de carregamento acessíveis ao público na Europa e, embora o número de carregadores de corrente contínua instalados no continente tivesse aumentado 90%, entre 2021 e 2022, este ritmo poderá não ser suficiente até 2040.
Mas bem mais cedo, já em 2025, a EY estima que serão necessários um milhão de pontos de recarga pública na Europa. Ou seja, um aumento de mais de 50 por cento em dois anos. Feitas as contas, indica a EY, os países do bloco europeu precisarão aproximadamente de 670.000 novos pontos de carga por ano, ou 13.000 por semana.
Para concretizar esta meta, serão precisos cerca de 350 mil milhões de euros de investimento, essenciais para cobrir os custos com o equipamento e com a instalação.
A consultora recomenda que esses postos se concentrem nos locais de chegada, tais como centros comerciais e junto aos locais de trabalho, sugerindo que as empresas instalem mais de 600.000 novos carregadores para os seus funcionários. Para a próxima década, o número de carregadores públicos deverá ascender aos 2,8 milhões, enquanto os locais de trabalho deverão contabilizar 2,4 milhões postos de recarga, estima a EY.
“Embora seja um desafio significativo, a implementação pode ser acelerada através da remoção de barreiras regulamentares”, diz o estudo, sugerindo, a título de exemplo, a facilitação no acesso a terrenos para a instalação de infraestruturas, melhores e mais rápidos processos de licenciamento e melhores ligações à rede de energia.
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