16 outubro 2024

Lembra-se do Tata Nano? Morreu o pai do carro mais barato do mundo

Tata Nano

O Nano foi um sonho. Foi o sonho de Ratan Tata, empresário indiano que morreu a 9 de outubro, aos 86 anos, e que era uma das personalidades mais amadas da Índia. Mas também o sonho de milhões, que, quando o pequeno veículo foi apresentado e o seu preço revelado (cem mil rupias, o equivalente hoje a mil euros), se puseram a fazer contas e a concluir que, ao contrário de todas as expectativas, podiam adquirir um carro novinho em folha.

Tendo em conta o panorama indiano, em que não é incomum ver motociclos a transportar não dois, mas três ou quatro passageiros, o Nano parecia constituir uma resposta à democratização do automóvel na Índia. E, ainda em pré-venda, o veículo teve mais de 200 mil a assinalarem o interesse.

Procura um carro usado barato?

O Tata Nano foi revelado no Salão de Nova Deli, em 2008. Tratava-se de um modelo com 3043mm de comprimento e 1495 mm de largura, servido por um motor de 624 cm³ de cilindrada, com dois cilindros, a debitar 33 cv e com binário máximo de 48 Nm. Já as prestações não eram de pasmar: acelerava de 0 a 100 km/h em 2 minutos! Mas, surpreendentemente atingia os 110 km/h.

Do sonho ao pesadelo

No papel, tudo parecia fazer sentido, já que era uma oportunidade de mobilidade sem apanhar chuva, por exemplo. Mas o sucesso do modelo parecia estar condenado à partida.

No Salão de Nova Deli, Ratan Tata deixou a promessa de que as primeiras unidades estariam para muito breve. Mas a localização da fábrica desencadeou logo o primeiro problema: a Tata Motors anunciou em 2006 que o Nano seria fabricado em Singur, Bengala Ocidental, mas protestos dos agricultores locais começaram por forçar o adiamento do lançamento do Nano e, depois, a mudança de localização, para Sanand, em Gujarat.

Tata Nano Standvirtual

Ultrapassada a questão da localização, o modelo começou a sair das linhas de produção e a ser entregue a orgulhosos proprietários. Só que uma série de incidentes com Nanos a incendiarem-se, alguns poucos metros após saírem dos concessionários, transformou o carro mais desejado no automóvel menos apetecível.

Os incêndios mostraram como o Nano ardia rapidamente: afinal muitos dos materiais resistentes foram substituídos por plásticos de fraca qualidade. Só que a empresa negou que os incêndios estivessem relacionados com a conceção do automóvel ou com as suas peças. Na época, a empresa apontou a responsabilidade ao equipamento elétrico no topo do sistema de escape e ofereceu-se para reequipar os sistemas de escape e elétrico. Em Dezembro de 2010, alargou a garantia do automóvel de 18 meses para quatro anos, incluindo nesse pacote as unidades que já tinham sido comercializadas. Mas o mal estava feito: podia parecer mais seguro do que circular numa motorizada com quatro pessoas, mas as motos não ardiam tanto…

O marketing em torno da ideia de “o carro mais barato do mundo” também se viraria contra a Tata. É que o automóvel depressa recebeu o rótulo de ser um veículo para pobres, e muitos preferiam optar por um usado que conferisse melhor estatuto social.

Resultado: a Tata esperava revolucionar o mercado e vender cerca de 250 mil unidades por ano. Mas, ao fim de dez anos, o modelo tinha acumulado apenas cerca de 270 mil vendas.

O Nano no mundo

Um dos objetivos de Ratan Tata, que foi bem sucedido no lançamento do Indica, em 1998, era que o Nano fosse um produto global, disponibilizando-o na Europa e nos EUA. Para tal, o Global NCAP realizou um teste de colisão com um Tata Nano do mercado indiano nas instalações do ADAC na Alemanha, na sua ronda piloto de testes de colisão com barreira deformável de 64 km/h para o seu projeto “Safer Cars for India”. Mas o resultado foi amargo. Sem airbags ou travões ABS, o Nano obteve zero estrelas para a proteção dos ocupantes adultos e crianças.

Tata GenX

Ainda houve uma nova tentativa de reanimar o Nano, já depois de Ratan Tata ter saído da presidência do grupo, Em 2015, o Nano chegou a ter uma segunda geração, chamada de GenX, que já incluía alguns itens de conforto, como ar condicionado e sistema de som. No entanto, a adesão dos condutores manteve-se fraca e, em 2018, o modelo foi descontinuado.

Ratan Tata, industrial amado

O pai do Nano morreu a 9 de outubro, aos 86 anos. A sua morte foi lamentada por toda a Índia, que o olhava como um homem poderoso que nunca se deixou corromper pela fortuna e glória – aliás, Tata nunca integrou a lista dos multimilionários da Forbes por uma simples razão: não acumulava dinheiro, com a maior parte dos lucros do grupo a serem entregues a uma fundação que investe em programas de saúde e educação no país.

Também se destacava pelo seu amor aos animais, sendo que as suas publicações nas redes sociais muitas vezes versavam sobre a sua preocupação com os cães de rua. E foi a pensar neles que financiou um hospital veterinário, que recentemente começou a operar em Bombaim.

O primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, lamentou a morte de Ratan Tata na rede social X, descrevendo o empresário como “um líder visionário, uma alma compassiva e um ser humano extraordinário”.

O funeral de Ratan Tata, a 10 de outubro, teve honras de Estado e o Governo indiano decretou um dia de luto nacional.

Leia também: